Desde 2020, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a pandemia da COVID-19, a vulnerabilidade das economias globais altamente dependentes das cadeias de suprimentos internacionais e das estruturas tradicionais de poder econômico tornou-se mais evidente. A pandemia acelerou as tendências pré-existentes e trouxe novas dinâmicas que estão remodelando as relações globais. Um dos destaques mais significativos dessa mudança é a crescente relevância das potências emergentes e novas regiões como centros de desenvolvimento econômico.
A história diplomática do Brasil é marcada por uma busca contínua por uma presença influente e equilibrada no cenário global. Desde que se tornou independente, o país tem procurado estabelecer relações bilaterais e multilaterais estratégicas, implementando uma política externa focada na cooperação econômica e promovendo uma ordem internacional multipolar.
No contexto da nova ordem econômica mundial, com a crescente multipolaridade e a reconfiguração dos centros de poder, as condições possibilitam ao Brasil fortalecer suas relações com o mercado árabe. Com o surgimento de novas economias e o foco na diversificação econômica, vários países árabes estão buscando parcerias estratégicas para garantir o acesso a novos mercados e tecnologias, bem como diversificar suas exportações e garantir a segurança alimentar de seus nacionais. Nesse sentido, a economia brasileira, com seu potencial em setores como agricultura, energia e tecnologia, surge para complementar a economia dos países árabes, criando oportunidades de crescimento mútuo.
A diversificação dos destinos de exportação do Brasil é crucial para reduzir a dependência excessiva de um mercado único, como a China, que atualmente responde por uma parcela significativa das exportações do Brasil. Embora a China seja um parceiro comercial crítico, concentrar as exportações em um mercado único torna o país vulnerável a riscos econômicos e políticos, como oscilações na demanda, mudanças nas políticas comerciais e instabilidade econômica.
O caminho econômico dos Emirados Árabes Unidos (EAU) e da Arábia Saudita mostra uma transição notável das economias baseadas no petróleo para os centros de diversificação e inovação econômica. Essa mudança, aliada a políticas estratégicas voltadas para a segurança alimentar e o desenvolvimento sustentável, oferece novas perspectivas para os produtos agrícolas brasileiros.
Em 2024, o Brasil comemora 50 anos de relações diplomáticas com os Emirados Árabes Unidos. Só entre Janeiro e Agosto deste ano, o país foi o destino de US$ 3,3 mil milhões nas exportações brasileiras, das quais o sector agrícola representou US$ 2,24 mil milhões (68%), especialmente o seu complexo de carne e álcool-açúcar.
O Brasil mantém relações diplomáticas com a Arábia Saudita há 56 anos. Nos últimos anos, as negociações foram impulsionadas com visitas oficiais e assinatura de acordos de cooperação em áreas como defesa e tecnologia. Com a sua experiência em agricultura e biocombustíveis, o Brasil oferece soluções alinhadas com os objetivos sauditas de diversificação económica e segurança alimentar no âmbito da “Vision 2030”. Ao mesmo tempo, o investimento saudita no Brasil aumentou, particularmente nos setores de infraestrutura e energia, refletindo a crescente interdependência econômica. Entre Janeiro e Agosto de 2024, a Arábia Saudita foi o destino de US$ 2 mil milhões nas exportações brasileiras, dos quais 73,5% (US$ 1,47 mil milhões) vieram da agricultura e pecuária brasileiras, semelhante ao padrão de compra de carne e produtos do complexo açúcar-álcool.
Ambos os países estão estrategicamente localizados, funcionando como pontes entre a Europa, a Ásia e a África, o que facilita o comércio global e os torna centros logísticos naturais para vários setores, especialmente através de seus portos e aeroportos de classe mundial. Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, é um dos maiores centros de transporte aéreo e marítimo do mundo. Além disso, os Emirados Árabes Unidos e a Arábia Saudita são países politicamente estáveis, com economias robustas abertas ao comércio internacional. Eles oferecem incentivos para investidores estrangeiros e um ambiente regulatório favorável para a criação de empresas globais, que por sua vez as consolidam como centros financeiros e comerciais.
Todas essas vantagens competitivas, bem como o papel ativo desses países em organizações como as Nações Unidas (ONU), a Organização Mundial do Comércio (OMC) e o Grupo dos 20 (G20), reforçam a importância de relações mais estreitas entre o Brasil, os Emirados Árabes Unidos e a Arábia Saudita. A Confederação Brasileira de Agricultura e Pecuária (CNA) está atenta a esse cenário e, desde fevereiro de 2022, mantém um escritório em Dubai para apoiar principalmente pequenos e médios produtores rurais em sua busca por novos mercados. Entre os dias 24 e 26 de setembro, uma delegação de empresários brasileiros participará da Gulfood Green Fair em Dubai, focada em produtos orgânicos e de maior valor agregado, como parte do Projeto AgroBR.
Elena Castellani, Conselheira de Relações Internacionais da CNA